Senado aprova auxílio para estados e municípios; recursos não significam dinheiro extra e sim compensação de perdas devido à pandemia do coronavírus

A versão aprovada não era o que esperava o movimento municipalista, então, a AMM apoia a CNM na luta pela divisão igualitária para estados e municípios, na votação na Câmara dos Deputados

O Plenário do Senado aprovou neste sábado (2) o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus – PLP 39/2020 (leia aqui), que prestará auxílio financeiro de R$ 125 bilhões a estados e municípios para combate à pandemia da Covid-19. O valor inclui repasses diretos e suspensão de dívidas. Foram 79 votos favoráveis e um voto contrário. Deve-se ficar claro que não é dinheiro novo, e sim uma compensação de perdas pela queda de arrecadação dos estados e municípios com a pandemia do Covid-19. Salienta-se ainda que, em Minas Gerais, a queda de arrecadação do ICMS foi 30% o que afetou diretamente as receitas dos municípios.

O tema segue para a Câmara dos Deputados. Dessa forma, o Senado, como autor do projeto de lei (PLP 39/2020), terá a palavra final sobre o assunto — ou seja, caso os deputados promovam mudanças, elas terão que ser confirmadas pelos senadores.

De acordo com o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), primeiro vice-presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM) e prefeito de Moema, Julvan Lacerda, este projeto de socorro aos estados e aos municípios é insuficiente para compensar as perdas de arrecadação das cidades mineiras diante da pandemia do novo coronavírus.

Em entrevista à imprensa, Julvan Lacerda afirma que a verba não é “dinheiro do governo federal que está sendo dado para governadores e prefeitos”, mas uma partilha dos recursos arrecadados com a sociedade. Para ele, a Federação está de “cabeça para baixo”, pois o dinheiro está concentrado no governo federal e nos estados, enquanto quem presta os serviços são as cidades.

“Os valores como ficaram não vão atender os municípios. Mais uma vez nesse projeto aconteceu isso: 60% do valor da reposição está indo para os estados, e 40% para os municípios. E a perda (de arrecadação) é de 56% dos municípios e 44% dos estados. Então, inverteu (a ajuda). Estamos defendendo é que isso seja aprovado do jeito que está, rápido, porque, se ficar o mês de maio sem ter a reposição, vai atrasar salário, vai parar de prestar serviços. Aprova do jeito que está e, depois, vamos discutir isso de novo, uma reposição de outra forma”, afirma Julvan.

O auxílio foi aprovado na forma de um texto apresentado pelo relator, senador Davi Alcolumbre, e que substitui a proposta original enviada pela Câmara (PLP 149/2019). O rateio, parte do pacote financeiro, também foi modificado na votação, reduzindo a participação dos municípios em R$ 5 bilhões. A Associação Mineira de Municípios (AMM) lamenta a quebra do acordo que dividia igualmente o valor para estados e municípios e apoia a Confederação Nacional de Municípios (CNM) na luta pela reversão dessa divisão na Câmara dos Deputados.

A versão aprovada não era o que esperava o movimento municipalista. Liderado pela Confederação, o movimento apoiava integralmente a primeira versão do relatório apresentado pelo senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) por entender que ele atendia as demandas. Além de um pacote de R$ 119,6 bilhões, o texto estende o decreto de calamidade para todos os entes federativos, facilita o acesso a transferências voluntárias e operações de crédito, suspende o pagamento de dívidas e de operações de crédito interno e externo, e possibilita a securitização de contratos de dívida.

O programa

O programa vai direcionar R$ 60 bilhões em quatro parcelas mensais, sendo R$ 10 bilhões exclusivamente para ações de saúde e assistência social (R$ 7 bi para os estados e R$ 3 bi para os municípios) e R$ 50 bilhões para uso livre (R$ 30 bi para os estados e R$ 20 bi para os municípios). Além disso, o Distrito Federal receberá uma cota à parte, de R$ 154,6 milhões, em função de não participar do rateio entre os municípios. Esse valor também será remetido em quatro parcelas.

Além dos repasses, os estados e municípios serão beneficiados com a liberação de R$ 49 bilhões da suspensão e renegociação de dívidas com a União e com bancos públicos e de outros R$ 10,6 bilhões pela renegociação de empréstimos com organismos internacionais, que têm aval da União. Os municípios serão beneficiados, ainda, com a suspensão do pagamento de dívidas previdenciárias que venceriam até o final do ano. Essa medida foi acrescentada ao texto durante a votação, por meio de emenda, e deverá representar alívio de R$ 5,6 bilhões nas contas das prefeituras. Municípios que tenham regimes próprios de previdência para os seus servidores ficarão dispensados de pagar a contribuição patronal, desde que isso seja autorizado por lei municipal específica.

Distribuição 

A fórmula para repartir os recursos entre os entes federativos foi uma das alterações promovidas por Davi Alcolumbre no seu texto substitutivo. A versão da Câmara usava como critério a queda de arrecadação dos impostos sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS).

Em nota técnica publicada no último dia 24, a Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI) observou que essa regra levaria a um impacto fiscal de maior risco para a União, além de criar incentivo para um relaxamento de controles fiscais por parte dos estados e municípios. Além disso, Davi esclareceu que o critério antigo trazia problemas de operacionalização e fiscalização e tenderia a favorecer os estados e municípios mais ricos.

Dos R$ 60 bilhões de auxílio direto aprovados neste sábado, R$ 50 bilhões poderão ser usados livremente. Essa fatia será dividida em R$ 30 bilhões para os estados e o Distrito Federal e R$ 20 bilhões para os municípios. Originalmente, essa divisão era de metade para cada grupo de entes federativos, mas o Plenário reivindicou um aporte maior para os estados, o que foi acatado por Davi, presidente do Senado, que assumiu a relatoria e as negociações do texto na Câmara e com o governo federal.

O rateio por estado será feito em função da arrecadação do ICMS, da população, da cota no Fundo de Participação dos Estados e da contrapartida paga pela União pelas isenções fiscais relativas à exportação. Já o rateio entre os municípios será calculado dividindo os recursos por estado (excluindo o DF) usando os mesmos critérios para, então, dividir o valor estadual entre os municípios de acordo com a população de cada um.

Um dispositivo acrescentado ao projeto durante a votação determina que estados e municípios deverão privilegiar micro e pequenas empresas nas compras de produtos e serviços com os recursos liberados pelo projeto.

Por sua vez, os R$ 7 bilhões destinados aos estados para saúde e assistência serão divididos de acordo com a população de cada um (critério com peso de 60%) e com a taxa de incidência da covid-19 (peso de 40%), apurada no dia 5 de cada mês. Os R$ 3 bilhões enviados para os municípios para esse mesmo fim serão distribuídos de acordo com o tamanho da população.

Davi Alcolumbre explicou que usou a taxa de incidência como critério para estimular a aplicação de maior número de testes, o que é essencial para definir estratégias de combate à pandemia, e também porque ela serve para avaliar a capacidade do sistema de saúde local de acolher pacientes da covid-19. Já a distribuição de acordo com a população visa privilegiar os entes que poderão ter maior número absoluto de infectados e doentes. Davi observou que não adotou o mesmo critério para divisão entre os municípios porque é mais difícil medir a incidência em nível municipal e para não estimular ações que possam contribuir para espalhar mais rapidamente a covid-19, como a liberação de quarentenas.

Dívidas

A suspensão de dívidas abrangerá os pagamentos programados para todo o ano de 2020. Os valores não pagos serão incorporados ao saldo devedor apenas em 1º de janeiro de 2022, atualizados, mas sem juros, multas ou inclusão no cadastro de inadimplentes. A partir daí, o valor das parcelas que tiveram o pagamento suspenso será diluído nas parcelas seguintes.

Os valores pagos durante o período de suspensão serão atualizados e somados aos encargos de adimplência para abaterem o saldo da dívida a partir de janeiro de 2021. As parcelas anteriores a março de 2020 não pagas em razão de liminar da Justiça também poderão ser incluídas no programa. Também nesse caso não caberão juros e multa por inadimplência.

Em outra frente, o substitutivo permite a reestruturação das dívidas internas e externas dos entes federativos, incluindo a suspensão do pagamento das parcelas de 2020, desde que mantidas as condições originais do contrato. Nesse caso, não é necessário o aval da União para a repactuação e as garantias eventualmente oferecidas permanecem as mesmas.

Para acelerar o processo de renegociação, a proposta define que caberá às instituições financeiras verificar o cumprimento dos limites e condições dos aditivos aos contratos. Já a União fica proibida de executar garantias e contra garantias em caso de inadimplência nesses contratos, desde que a renegociação tenha sido inviabilizada por culpa da instituição credora.

Histórico

O PLP 149/2019 foi apresentado pelo governo à Câmara em junho para ajudar estados e municípios em situação financeira difícil a recuperarem o equilíbrio fiscal. Apelidado de “Plano Mansueto” (nome de seu idealizador, o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto de Almeida), o texto previa o refinanciamento de dívidas com a União e novos empréstimos, além de aumentar as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101, de 2000) para que as contas públicas dos entes federativos permanecessem equilibradas a médio e longo prazos.

Com o agravamento da pandemia da covid-19, e como o projeto já estava pronto para ser votado pela Câmara, os deputados usaram o texto para propor um programa de socorro aos entes da Federação. O ponto central era a compensação por perdas de arrecadação causadas pela queda na atividade econômica. Aprovado em abril, o novo PLP 149/2019 foi enviado ao Senado.

O projeto da Câmara, no entanto, desagradou a área econômica do governo federal por obrigar a União a compensar toda a perda de arrecadação com o ICMS e o ISS de abril a setembro de 2020, sem contrapartidas ou valor fixo.

O governo fez então uma contraproposta. Em audiência pública no Senado, na última quinta-feira (30), o ministro da Economia, Paulo Guedes, explicou que a União se propunha a desembolsar R$ 120 bilhões para ajudar estados e municípios, por meio de auxílio direto, suspensão do pagamento de dívidas e reforço ao Sistema Único de Saúde (SUS) e ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Como contrapartida, os entes adotariam medidas de controle dos gastos públicos.

O tema já era tratado, no Senado, pelo PLP 39/2020, do senador Antonio Anastasia, e, assim, os dois projetos passaram a tramitar em conjunto, cumprindo requerimento dos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Esperidião Amin. Em uma medida rara, a relatoria dos projetos foi entregue ao presidente Davi Alcolumbre, que fez a opção por dar preferência ao PLP 39/2020 para que o Senado pudesse tomar a frente nas negociações entre o Congresso e o Executivo. O parecer aprovado levou ao arquivamento do PLP 149/2020, que integrava o Plano Mais Brasil do governo federal.

Acompanhe os valores de cada município mineiro aqui: Estimativa de arrecadação com o relatório do PLP 39 de 2020

Confira a tabela do Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus:

Fonte: AMM